Subscribe Free Add to my PageÉ o seu trabalho. Promove cursos de ensino superior nas escolas secundárias. Costuma dizer, de si mesmo que é um transportador de sonhos. Percorre o país com o futuro, de muitos jovens, impressos em desdobráveis coloridos e atractivos.
Já lhe passaram milhares de rostos pelos olhos. Já caminhou por corredores e halls de entrada de dezenas de estabelecimentos de ensino. Costuma ter intervalos, no trabalho, quando os alunos terminam os seus e regressam às salas de aula.
Em Caminha, foi num desses momentos que se deixou prender numa gaiola de periquitos que, ali, existe junto da entrada principal.
Não sabe bem quantos, mas foram largos os minutos nos quais se deliciou com a rotina daqueles pássaros, em procriação.
Sorriu com galanteio dos machos. Enterneceu como, outros, buscavam comida para os levar até às crias, cuidadosamente escondidas nos ninhos. Deliciou-se com os ternos toques dos bicos, mais parecendo beijos de amantes.
De repente o pensamento é tolhido pela memória de uma notícia difundida por vários órgãos de comunicação social: a violência familiar cresce em Portugal. O distrito de Viana do Castelo, lê-se na imprensa regional, não escapa à pandemia. Em catadupa outros títulos, lidos no JN, Público ou Correio da Manhã assolam-o: "GNR denuncia abusos sexuais em criança", "Casal acusado de abusar de criança", "Bebé deixado no carro morre por esquecimento do pai", "Pedófilo detido pela GNR".
Os títulos não param de jorrar como se de um eco interminável se tratasse.
Ele interrompe à força a sequência. Olha de novo para a gaiola onde os pássaros continuam o seu ritual. Dá por ele a pensar: "Mas que raio de animais somos nós afinal?".
Ouve-se o toque de fim de aulas na escola. Ele regressa ao stand de divulgação. Transporta sonhos e leva consigo o futuro impresso em desdobráveis coloridos e atractivos. Milhares de rostos já lhe passaram pelos olhos.
Quantos deles serão um dia notícia?